O governo da Índia está processando a maior produtora de sementes geneticamente modificadas do mundo, a companhia multinacional de biotecnologia Monsanto, por biopirataria. De acordo com a rede de notícias France 24, é a primeira vez na história que um país processa uma empresa por roubo de plantas nativas. A intenção da empresa, segundo o processo, é modificar espécies vegetais tiradas clandestinamente do país, usando engenharia genética e assim oferecê-las como variedades patenteadas".
A ofensiva do governo indiano se deu depois de uma série de denúncias apresentadas por cooperativas que representam agricultores do país contra empresas como a Monsanto e Cargill, gigantes da produção e processamento de alimentos e da biotecnologia voltada para a agricultura. De acordo com a rede de notícias francesa, um dos pivôs da briga é justamente a beringela (ou berinjela), cuja cultura é nativa da Índia, onde é conhecida por brinjal.
Segundo o portal de notícias Wake Up the World, um dos principais sites de conteúdo pró-ambientalista em língua inglesa na internet, a Índia atualmente produz um quarto dos vegetais consumidos em todo o mundo. Somente de variedade de beringela são 2.500 espécies. Segundo o governo indiano, a Monsanto já vinha tentando produzir sua própria espécie de beringela, batizada de "berinjela BT" através de testes de reengenharia genética. O governo da Índia chegou a avaliar a autorização para que a empresa pudesse comercializar sementes modificadas a partir de espécies locais da verdura. Contudo, por conta da intensa mobilização popular contrária, o governo acabou desistindo de conceder a permissão à Monsanto.
De acordo com os autos do processo, a empresa continuou trabalhando em segredo no projeto, em clara violação à Lei de Diversidade Biológica do país (Biological Diversity Act, BDA). O processo corre na Justiça federal da Índia. A Monsanto atua no país há anos e comercializa no mercado interno sementes de diferentes espécies vegetais.
"Nossa iniciativa pode mandar um recado para as grandes companhias que insistem em violar nossas leis", disse K.S. Sugara, secretário do Conselho de Biodiversidade de Karnataka, Índia, à reportagem da France 24. "É inaceitável que agricultores em nossas comunidades estejam sendo roubados", protestou.
A empresa afirma, contudo, que suas pesquisas visam ajudar os agricultores indianos, fornecendo aos mesmos, para tanto, sementes mais resistentes. Porém, de acordo com o site Eurasia Review, o fornecimento de sementes modificadas aos agricultores indianos acabou repercutindo em uma onda de prejuízos durante as últimas safras, pois as novas sementes precisavam do dobro de água e de cuidados diferenciados para se desenvolverem.
O prejuízo resultou no endividamento de milhares de agricultores, o que acabou deflagrando o conflito entre produtores rurais do país e a Monsanto. Ainda de acordo com o Eurasia Review, o próprio Príncipe Charles, do Reino Unido, que é responsável por uma ONG que trabalha a favor de práticas agricolas sustentáveis, chegou a protestar publicamente contra a atuação da Monsanto no mercado indiano.
Segundo reportagem desta sexta-feira (30/12) do jornal indiano de língua inglesa, o Hindustan Times, uma outra fraude envolvendo pesquisa com algodão geneticamente modificado na Índia atinge também a reputação da Monsanto neste fim de ano. Usando recursos públicos e em colaboração com uma universidade local, a companhia teria produzido sem autorização, de acordo com as acusações, sementes de dois tipos modificados de algodão a partir de uma espécie nativa do país.
Revista Consultor Jurídico, 30 de dezembro de 2011